sábado, 30 de novembro de 2013

Diário da Noite, 26 de Julho de 1950

PROMESSA CUMPRIDA

Quando das comemorações em regozijo pela passagem da “Semana Carlos Gomes”, organizada para assinalar o centenário de nascimento do querido mestre campineiro, a comissão incumbida dos festejos se queixou, aliás com razão, da falta de gravações contendo páginas representativas do autor de O EscravoCartas, então, foram endereçadas pela aludida comissão às empresas gravadoras e, em resposta, várias delas prometeram providenciar gravações de partituras de Carlos Gomes, demonstrando assim alto espírito de colaboração para com os festejos. Ao que parece, entretanto, o apelo de Campinas foi feito um tanto tardiamente, pois por maior que fosse a boa vontade demonstrada pelas firmas não foi possível entregar os discos prometidos a tempo de alcançar a “Semana Carlos Gomes”. Apenas a Victor, que possuía em estoque a Sinfonia de O Guarani, pela Boston Pops, sob a direção de Arthur Fiedler, colocou na praça a bela e valiosa gravação.

Ao recebermos, agora, para ouvir, as provas da mesma partitura, isto é da Sinfonia de O Guarani, em arranjo especial para piano e orquestra, feito pelo maestro Francisco Mignone, em gravação Odeon, tendo ao piano Heriberto Muraro, secundado por grande orquestra, ficamos convencidos de que valeu a pena esperar. A gravadora da rua da Liberdade cumpriu a sua promessa e fê-lo regiamente, porquanto o disco em questão é, na realidade, uma preciosidade.

Carlos Gomes
É uma pena que os estúdios de gravações da Odeon, no Rio, não sejam maiores para que o som do grande conjunto fosse mais perfeito. Mesmo assim, entretanto, o disco, do primeiro ao último sulco é de uma perfeição digna dos melhores elogios. A começar pelo arranjo, que é fidelíssimo, sem deturpar a melodia, como é de hábito em certos arranjadores, passando pelos músicos de per si, pelo solista, cuja magnífica técnica todos conhecemos e admiramos, até o técnico, controlador do som, tudo saiu às mil maravilhas. A regência de Francisco Mignone, seguríssima, impondo ao conjunto todo poder de sua vigorosa batuta.

Os sons obtidos por Muraro, ao dedilhar espetacularmente o instrumento, especialmente na segunda face do disco, maravilha e emociona qualquer ouvinte, ainda que não seja brasileiro. Temos quase que a certeza de que a transcrição pianística de Francisco Mignone, dentro em pouco, irá figurar, obrigatoriamente nos programas de concertos para piano e orquestra em todos os teatros do mundo.

Heriberto Muraro
Segundo informações que obtivemos, a elaboração desse disco, excluindo a parte industrial, mas simplesmente a parte artística, ficou caríssima para a firma gravadora. Entretanto, vale o sacrifício, porquanto se trata de uma significativa contribuição em prol da arte nacional e vai popularizar, além das nossas fronteiras, uma das mais significativas páginas da música brasileira.

A promessa da tradicional etiqueta feita aos campineiros demorou um pouco, mas, repetimos, foi cumprida regiamente.


Na foto: O Muraro que vemos acima, com uma batuta na mão, é o Muraro regente de orquestra. Entretanto, sem desmerecer o seu valor como diretor de orquestra, Muraro é, antes de mais nada, o grande pianista que todos admiramos. A sua gravação de A Sinfonia de O Guarani, de Carlos Gomes, em arranjo para piano e orquestra de Francisco Mignone, vem reafirmar tudo o que se tem dito sobre o seu virtuosismo.

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