RETORNO AUSPICIOSO
Quando Carlos Ramirez esteve em São Paulo, já
faz alguns meses, propalou-se a decadência artística do famoso barítono. Falou
muita coisa mais a seu respeito, o que, evidentemente, não correspondia à
realidade. O fato, entretanto, é que Ramirez provocou comentários a seu
respeito, pelas noitadas que promoveu e pelas bizarras roupas que vestia,
alheio que estava ao ambiente casmurro e de trabalho da metrópole paulistana,
que não admite tais exageros.
Entretanto, a decadência de Ramirez não passou
de puro boato. Comprova-o a sua recente gravação para a Victor, em nos
proporciona duas bonitas canções: Marta, que leva a assinatura famosa de
Moisés Simon, autor de El Manisero; e Uno, uma adaptação para canção do
tango de Discépolo.
Em Marta, a potente, mas bem graduada voz
de Carlos Ramirez está à vontade. A composição de Moisés Simon, das mais
inspiradas brotadas da sua preciosa pena, primando pela docilidade, recebe do
aplaudido vocalista colombiano, um tratamento digno do seu renome. Sua voz se
apresenta com uma limpidez extraordinária, com aquele timbre agradabilíssimo,
como todos conhecemos, e com extensão que não encontramos com freqüência em
outros vocalistas do gênero. Há um trecho em Marta no qual Ramirez tem a
oportunidade de desmentir o que se propalou, sobre a sua decadência. É
precisamente na segunda parte, quando dá uma subida de tom, demonstrando assim
a sua alta escala.
Diário de S. Paulo, 2/2/50 - Clique para ver em alta resolução |
Uno, o tango que tanto sucesso obteve entre nós,
gravado por quase todos os conjuntos típicos e vocalistas argentinos – sendo
digna de nota a gravação executada por Tania – adaptado para canção e
vocalizado por Ramirez, embora se torne um tanto estanho, recebe do cantor
igual tratamento de Marta. Discépolo, com toda a certeza, ao ouvir a sua
composição na voz de Ramirez há de ter ficado maravilhado.
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Diário da Noite, 10/3/50 Clique para ver em alta resolução |
Mas, o curioso desse disco é que Carlos Ramirez,
tanto numa face como na outra, vocalizou em inglês e castelhano, seguindo a escola
do cantor franco-canadense Jean Cavall que, ao gravar os seus discos, canta em
francês e em inglês, para contentar todos os canadenses. Ramirez, assim,
contenta os americanos do norte e a maioria dos sul-americanos.
Em resumo, o disco em apreço é dos bons que a
Victor costuma apresentar em seu repertório internacional.
Na foto: Se Carlos Ramirez interpreta a canção
de Moisés Simon, Marta, Nicolás Urcelay, um dos maiores tenores do
México não a desmerece. Pela prova da gravação, que ouvimos nos estúdios da
Odeon, verificamos a diversidade dos estilos de Ramirez e de Urcelay. Não
poderia ser de outra maneira: um é barítono e outro é tenor. Todavia, a voz de
Nicolás Urcelay é tão extensiva e de tonalidade tão agradável quanto a do
barítono colombiano. A diferença reside apenas no timbre da voz e no lançamento
do disco. Enquanto a Victor vem de lançar Marta, com Ramirez, a Odeon
lançará Marta com Urcelay, em princípios do próximo mês. Marta,
porém, com o tenor ou com o barítono está ótima. O ideal seria o possuirmos os
dois discos...
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